terça-feira, 17 de outubro de 2017
Evasão Escolar: Quase três milhões de jovens decidem abandonar a escola anualmente no Brasil, diz pesquisa
Fonte (link)
"Um levantamento do Instituto Ayrton Senna e do Insper revela que a
saída desses alunos gera um prejuízo de R$ 35 bilhões ao país. Os principais
motivos para a evasão escolar são a qualidade de ensino, o clima do ambiente
escolar e a baixa resiliência emocional (CBN)". A partir dessa divulgação
realizada há pouco pela rádio e site CBN, passei a refletir sobre os inúmeros
problemas da educação e, automaticamente, de algumas possibilidades de reversão
do quadro.
Pela pesquisa, é evidente que há uma tendência para o agravamento da
situação, ao contrário das propagandas realizadas pelo ministro da Educação e
MEC, uma vez que eles alegam que a reforma do ensino médio será positiva,
quando sabemos que é medida paliativa para que a escola possa atender ainda
mais as exigências do mercado de trabalho, desconsiderando, para todos os
efeitos, as possibilidades de emancipação pelo conhecimento e evolução do
pensamento. A nossa Constituição, outrora denominada de Constituição Cidadã
(pois suas intensas deformações, sobretudo nos últimos meses está erodindo
todas as possibilidades de cidadania) prezou por uma educação para a cidadania.
Logo, as políticas públicas voltadas para a educação tinham que dar conta não
apenas dos conhecimentos técnicos e propedêuticos para o acesso ao mercado de
trabalho, mas sobretudo que pudesse gerar emancipação pelo saber, formação
cidadã e preparação para o mundo social do trabalho, consequentemente, para o
mundo da vida. Só essa mudança de concepção já causaria alterações
irreversíveis na condição atual.
No entanto, os cursos de formação de professores, em sua maioria, prezam
mais pelos conhecimentos e conteúdos que envolvam formação de pesquisadores do
que vieses que tragam e desenvolvam habilidades relacionadas à formação "de"
professor. É comum ouvirmos que o profissional egresso dos cursos de
formação de professores precisam aprender na prática, pois a universidade e/ou
faculdade não ensinou-o a ser professor e atuar como professor.
Paralelamente a isso, os que conseguem tornar-se professores ou educadores,
com ampla leitura sobre os pressupostos pedagógicos, que consigam relacionar os
conhecimentos vinculados ao entendimento do estudante como sujeito de sua
própria história, bem como que compreendem as particularidades do mundo
escolar, deparam-se com dificuldades estruturais, cujas variáveis não cabem
nessa análise, dada sua expansão e brutalidade. Mas realçamos, por exemplo, as
mais presentes, como desvalorização da profissão, baixos salários, alta carga
horária de aulas e condição itinerante do professor, cujo único tempo de
reflexão e preparo é revertido para a mobilidade entre uma e outra escola.
Na miríade conhecida de adversidades, podemos destacar os métodos e
tendências pedagógicas adotadas, consideradas pelos muitos gabinetes que pensam
a educação como ultrapassadas e que não mais dão conta das necessidades do
mundo atual.
É sabido que a humanidade evoluiu em progressão geométrica, se pensarmos
em termos de tecnologias e facilitadores da vida cotidiana. Porém,
infelizmente, essa evolução é desigual, tanto em termos de distribuição de
renda [ler sobre isso na matéria sobre Oxfam] e acesso às oportunidades, quanto em termos de rebatimento no território,
pois o desenvolvimento geográfico desigual ilustra as particularidades e
diferenças entre as regiões brasileiras, se pensarmos apenas em nosso caso.
Tais características do sistema produtivo atingiu também os espaços escolares,
pois a educação sempre foi deixada em planos subalternos àqueles destinados ao
desenvolvimento do setor produtivo. Isso é contraditório, pois sabemos que há
uma sincronia entre educação, tecnologia e desenvolvimento dos setores
produtivos e sociais, o que demonstra que não há, evidentemente, interesses por
parte da elite econômica e política deste país, de viabilizar uma educação
universal que traga o mínimo de dignidade e possibilidades de execução para as
comunidades envolvidas.
O sistema implementado, arcaico e ultrapassado, recria e permite uma
relação causal e circular entre execução e desastre, de modo que não mais
consigamos identificar a linha tênue que possa separar a gestão de todo
processo e a consequente prática pedagógica, dos resultantes e rebatimentos na
sociedade.
O que temos certeza é que não funciona, pois os índices e dados,
inclusive os desta pesquisa, demonstram que serão necessárias intervenções
estruturais e de longo prazo, que, digamos de passagem, devem estar na
contramão dessa pseudorreforma colocada verticalmente por um ilegítimo governo.
Os jovens precisam trabalhar, pois as condições de vulnerabilidade urgem à
frente das mínimas condições de manutenção dentro da escola e, por isso, deixam
a escola. Porém, de acordo com a pesquisa, os principais motivos da evasão são a
qualidade de ensino, o clima do ambiente escolar e a baixa resiliência
emocional.
Em termos de qualidade do ensino, considerando todas as variáveis que já
apontamos, é necessário compreender que a maioria dos jovens têm acesso aos
meios de comunicação de massa, aos recursos viabilizados pelos meios de
comunicação de massa e tecnologia e atrativos digitais e tecnológicos melhores
do que uma aula. Além disso, a maioria preocupa-se com as condições
fisiológicas e emocionais, que envolvem a vida relacional, desviando os
interesses pela escola. Soma-se a isso, o fato de o ensino, em caixinhas e
disciplinas separadas e sem significado e rebatimento direto na vida cotidiana
inibe os interesses e não produz o encantamento necessário para que o jovem
sinta-se sujeito do processo escolar. É necessário buscar novos currículos,
diversificados e atraentes, em uma perspectiva de aprender fazendo, o que a
pedagogia por projetos [ver exemplos sobre isso] pode ser uma saída interessante. O jovem, agente e não
ator de um processo, pode transformar o espaço e o ambiente escolar, a partir
de uma atuação cotidiana, que envolva pesquisa, extensão e ensino de forma
indissociável, cuja prática torna-se o motor para a compreensão dos pressupostos
teóricos e do conhecimento historicamente produzido.
Entramos, desse modo, no segundo motivo: o clima do ambiente escolar. As
dificuldades herdadas pela comunidade e por ambientes de vulnerabilidades de
todas as ordens, inerentes à complexidade familiar e institucional, leva o
indivíduo a buscar resistências, o que gera conflitos. Tais conflitos passam
pela perspectiva das relações interpessoais entre os próprios estudantes e
entre eles e os docentes. Os professores, em parte doentes por diversos
motivos, entre eles os que já apontamos, passam pela perplexidade de uma
formação que inviabilizou sua atuação, com a adição direta dos problemas relacionados
aos valores das gerações. Docentes formados por outros valores e concepções,
geralmente tradicionais, agora não conseguem criar uma intersecção entre a
forma de vida da "geração polegarzinho". A saída é pela leitura e
pela formação continuada, que é artigo de luxo em uma labuta de 3 turnos. Os
docentes, tendo que cumprir as bases comuns, transmitem os conhecimentos
independentemente da aprendizagem de seus estudantes.
Jovens que acessam a informação com uma velocidade muito maior do que os
adultos, passam como planadores no oceano, apenas de forma rasante sobre os
saberes, sem conhecer e ter qualquer condição de conhecer os saberes de forma
abissal. São envolvidos pelas atratividades de uma mídia manipuladora que os
convertem em virtuosos "papagaios" na interpretação da realidade. A
simbiose entre os problemas inerentes à vida do sujeito e os problemas trazidos
pela escola geram situações tóxicas em relação ao clima e ambiente escolar,
desmotivando a continuidade. Para o docente, é enxugar gelo; para o estudante,
é entediante e perca de tempo. As soluções passam pela discussão sobre os
engessamentos escolares, que nada permitem e que desconectam os estudantes do
mundo, quando deveriam conectá-los. A aprendizagem com significado gera o
"pagamento" ao docente, pois ver o estudante aprendendo é dignificante
e prazeroso. Mas isso só é possível se ocorrer uma mudança curricular que mude
o tempo e os espaços de trabalho, dinamitando as paredes e lacunas, físicas ou
burocráticas, que inibem a liberdade de aprender e ensinar [ver exemplo temático].
Por fim, a baixa resiliência emocional está relacionada ao que também
apontamos. Longe de esgotarmos um tema tão complexo em termos psicológicos e
psicossociais, sabemos que a modernidade líquida trouxe situações ainda
passíveis e carentes de interpretação. No entanto, é salutar observarmos que a
dificuldade de encarar frustrações, os conflitos com um ambiente escolar que
mais parece um presídio e o descolamento entre a prática pedagógica e as
necessidades atuais da sociedade são variáveis a serem consideradas para
entendermos essa lógica.
A alteração da lógica passa por discussões sobre a necessidade de
fragmentar o sistema, pois um país com 5.570 municípios, 27 estados e uma
população de aproximadamente 207 milhões de habitantes em uma extensão
territorial de dimensão continental, não pode ser regido por uma base, um
sistema, uma forma de controle e apenas uma gestão, agora apodrecida por gente
que não deveria nem passar pela Esplanada dos Ministérios. A liberdade de execução, a capacidade de interação
com os envolvidos e o respeito às particularidades locais e regionais podem ser
saídas interessantes para o rompimento de uma lógica de sociedade que, ao invés
de privilegiar a educação, realiza culto ao sistema carcerário e produz valores
que a Idade Média já demonstrou que não dá certo.
Pós-Doutorando pelo Instituto de Pesquisa e Planejamento Urbano e Regional da Universidade Federal do Rio de Janeiro (IPPUR/UFRJ); Doutor em Geografia pelo Programa de Pós-Graduação em Geografia da Universidade Estadual de Maringá (PGE-UEM); Pesquisador do Grupo de Estudos Urbanos (GEUR/UEM) e do Observatório das Metrópoles (UFRJ e UEM). Professor do Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia do Paraná (IFPR); Consultor da UNESCO/MEC; Conselheiro no Conselho Municipal de Planejamento e Gestão Territorial (CMPGT) de Maringá (PR) e Delegado da Assembléia de Planejamento e Gestão Territorial 5 (APGT-5) de Maringá (PR).
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