Os portadores da opinião que o ente metafísico a que se dá o
nome de mercado é divino, vêm a sua materialidade nas cotações das Bolsas.
Trata-se de pura ideologia.
Deixem o mercado trabalhar livremente e ele, por si mesmo,
encontrará "naturalmente" o equilíbrio gerador da estabilidade e da
prosperidade! A Bolsa de Valores foi a fonte da expansão que criou o
"capitalismo": a generalização da sociedade anônima; a acumulação do
capital necessário para financiar empreendimentos arriscados com ações que
repartem o risco e simultaneamente lhe dão liquidez; a criação dos bancos que
transformam o curto prazo em longo etc.
Longa experiência histórica, entretanto, mostra que sem uma
regulação que imponha alguma moralidade aos seus operadores, cuja imaginação
parece infinita, o "mercado" tem uma enorme propensão à fraude que
sempre pune apenas honestos e incautos investidores. Em pelo menos dois
episódios –1929 e 2007–, produziram tragédias mundiais.
Quem se interessar pela história verá que, guardadas as
proporções, aquelas duas crises (que não se confundem com as crises ínsitas ao
sistema capitalista) tiveram a mesma origem e foram apoiadas na mesma
ideologia.
Ela dominou o pensamento econômico que se seguiu à Primeira
Guerra Mundial e foi posteriormente recuperada pela lenta destruição do
controle rooseveltiano que salvou o "capitalismo" na crise de 1929.
Meio século depois, o sistema financeiro logrou capturar o poder político nos
EUA nas eras Reagan-Bush pai-Clinton-Bush filho-Obama 1-(1981-2012) e, com o
apoio "ad hoc" de economistas do "mercado perfeito",
destruiu toda regulação que o constrangia e restabeleceu a ideologia do
"laissez-faire".
Deu no que deu, outra vez!
Logo, a opinião do tal "mercado" revelada no seu
oráculo, a Bolsa de Valores, deve ser levada "cum grano salis".
A Petrobras continua, indisputadamente, no "estado da
arte" na sua componente tecnológica e seu trágico desarranjo, que vai ser
analisado e punido, se for o caso, pelo Judiciário, é basicamente
organizacional e financeiro.
Por que, então, estranhar a escolha de dois excelentes
administradores financeiros, os senhores Aldemir Bendini e Ivan de Souza
Monteiro, testados com sucesso numa organização gigantesca, eficiente e de alta
qualidade profissional, o Banco do Brasil?
Por que, afinal, eles precisam "entender" de
petróleo como pediu o tal "mercado", se têm na diretoria técnicos que
cresceram na Petrobras e entendem dele?
Aliás, o mercado, entende de petróleo? Então por que ainda
está tonto com a queda dos seus preços?
Antonio Delfim Netto, ex-ministro da Fazenda (governos Costa e Silva e Médici), é economista e ex-deputado federal. Professor catedrático na Universidade de São Paulo. Escreve às quartas-feiras.
Fonte: Colunistas da Folha